segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O cinema pode educar?

 

Em seu texto Por que cinema?, Roseli Silva (2007) acredita nas possibilidades educativas e éticas do cinema. Estes outros ‘usos’ do cinema viriam na esteira da experiência estética específica oferecida pelas películas áudio-visuais. Pergunta a autora: “se nos emocionamos com o cinema, por que não podemos aprender? Ele é somente diversão?”

De início, podemos lembrar à autora que a educação não está entre os objetivos primordiais no processo de criação da obra cinematográfica, principalmente, no “filme comercial”. O alto custo de produção envolvido neste processo coloca em segundo plano uma série de possibilidades para o filme. Antes de qualquer coisa, um filme significa um alto investimento. Dependendo do filme, chegamos à cifra dos milhões. Assim, seguindo a lógica do mercado, um alto investimento, requer alto lucro e, de preferência, com poucos riscos. É por causa disto, que os realizadores de “filmes arraza-quarteirões” (tradução para o português da expressão inglesa “blockbusters” que não é muito empregada entre nós) diminuem ao máximo a possibilidade do fracasso. Eles querem sucesso de bilheteria, querem povo, querem números, querem quebrar recordes! Isto significa que para ser um “sucesso de bilheteria”, o filme deve se comunicar com o maior número possível de pessoas. Aqui entra em cena um paradoxo. Lembramos de uma preciosa frase de Nelson Rodrigues: “toda unanimidade é burra”. Ou seja, se os realizadores querem (e precisam) conquistar o maior público assistente possível, não deixam muito espaço para os riscos, tão necessários à criação artística (por sinal, para se criar, antes é necessário destruir). Sendo assim, eles buscam uma recepção fácil entre a platéia, querem sensibilizar, comunicar com o maior número de pessoas: agradar a gregos e troianos. A única forma segura para isto é operar na chave do senso comum, da grande Doxa, ou, para valorizar nosso dramaturgo brasileiro: valorizar a burrice nas pessoas. Usam chavões, apelam ao senso-comum, operam com os preconceitos, recorrerem às fórmulas prontas. Quais as conseqüências?

Para os iniciados nesta arte, os chamados cinéfilos, os ‘nerds’ da sétima arte, o filme comercial – feito para o sucesso dos números – não acrescentará muito em sua cultura fílmica, na sua história da fruição, no seu rol de sensações e emoções vividas ao longo dos vários anos apreciando uma infinidade de filmes. O “filme comercial holywoodiano”, como é conhecido, não traz nada de novo em termos de experiência estética para seu assistente amante. Claro é que esta situação não é uma regra no mundo em película. Se assim o fosse não teríamos, quando em vez, filmes que são, ao mesmo tempo, “sucesso de público e crítica”, outra expressão ordinária nas páginas dos jornais. Mas este pano é para outras mangas.

Por hora, estamos aqui a pensar se se é possível educar por meio de filmes. Recentemente, saboreei o livro de um canadense, crítico de cinema, que propõe ao filho desinteressado pela escola, trocá-la por sessões particulares de cinema. O pai elencou uma série de “filmes clássicos”, de sua preferência, para que os dois assistissem e depois debatessem cada obra. Claro em ficou que a proposta educativa do pai crítico que teve maior sucesso foi a da estética. Ao acumular um capital cinematográfico, escolhido a dedo, logo o filho tornou-se seletivo e passou a ver as qualidades artísticas dos filmes, inclusive, desenvolver um gosto diferenciado do pai, que apesar de discordar do cânone do filho, respeitava-o. Para além desta educação estética, o projeto pedagógico do pai só teve sucesso na esfera privada do filho. Os dois passaram a conviver em decorrência do compromisso de assistir aos filmes e em debatê-los. Assim, tornaram-se mais próximos e logo surgiu entre os dois uma amizade e uma cumplicidade muito rara entre pais e filhos. Fora este trunfo, para mim, o projeto pedagógico do pai falhou, monstruosamente, em substituir o da escola.

Voltando a questão que a autora nos apresenta em seu livro (qual seja, assim como o cinema emociona, também educaria?) por hora, nossa opinião é a seguinte: os filmes que se propõe a educar são, na maioria das vezes, chatos. Podem despertar nossa curiosidade... nos informar sobre um tema... e só. Cinema é mais que isto! É mais que educação, é mais que informação, é mais que realidade. Assim, eles não devem ensinar, ao menos, somente isto. Eles devem ser cinema. Agora, se nós professores usamos o cinema com objetivos didáticos, é um problema nosso. O problema/função/destino/missão d@s cineastas é criar!

ref: SILVA, Roseli Pereira. Cinema e educação. São Paulo: Cortez, 2007.